Valham-nos os santos populares

Capa da revista 'Ilustração', n.º 60 de 16-6-1928 (ilustração por Jorge Barradas)
Capa da revista 'Ilustração', n.º 60 de 16-6-1928 (ilustração por Jorge Barradas). Fonte: Hemeroteca de Lisboa.

A onda de direita que assola a Europa tem na crista uma luzinha que atrai os eleitores e essa luzinha é a promessa de instalar a ordem, pondo cobro à violência e ao crime. De facto a esquerda não soube equilibrar e fazer interagir as ideias de justiça social e da liberdade responsável. Como evitar, na maior parte dos casos, o efeito perverso de punir as vítimas? Eis um problema que exige prudência inteligente, coragem e empenhamento político, e não é de fácil solução. Mas, aumentando a distância entre os ricos e os pobres (o desemprego é assustador e perigoso), não se vê que a direita possa encaminhar bem as águas. Os tempos são difíceis (foram sempre) como o demonstram as preocupações do grupo de Davos e a multidão de Porto Alegre. Perante os factos, permitam-me o contributo de umas quadrinhas de recurso aos santos populares. Ora pois.

Não é certamente com versos que o mundo se compõe, mas podem ajudar, neste caso como quem mete uma cunha. Não, não: esta cunha é apenas semelhante à que usam os carpinteiros. Sem esquecer S. José.

Santo António milagreiro,
Tende piedade de nós:
Uns cultivam a nogueira
E os outros comem-lhe a noz.

S. João que baptizaste
Jesus Cristo Redentor,
Baptiza também o mundo
Que vai de mal a pior.

E tu, S. Pedro, vigia
As fontes celestiais:
Há mais pobres que ricos,
Mas os ricos bebem mais.

in Semanário Transmontano (5-7-2002)

António Cabral para Eito Fora por Pedro Colaço Rosário (2001)

António Cabral [1931-2007] foi um poeta, ficcionista, cronista, ensaísta, dramaturgo, etnógrafo e divulgador da cultura popular portuguesa.

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