Gosto de me servir dos dicionários. Quantas ideias me oferecem, sem pedirem em troca mais do que o preço de os comprar e/ou consultar! Abro o Petit Larousse e leio (traduzo): “revolução: mudança brusca e violenta na estrutura económica, social ou política de um Estado”. É evidente que estou a pensar no 25 de Abril e no que ele teve de autenticamente revolucionário. Foi efectivamente uma mudança brusca e violenta em múltiplos sectores da vida portuguesa. Violenta, acentuo, apesar dos cravos e das ovações. A violência não quer dizer apenas guerra e sangue que, de resto, não são a sua melhor e mais bela forma; quer dizer sobretudo (volto ao Larousse): “força intensa, impetuosa”. Ora esta existiu: um querer que estilhaçava as taipas que quase cinquenta anos colocaram entre o eu e o mundo, mergulhava no fundo da nossa personalidade e aí arrancava caudais impetuosos, dir-se-ia imparáveis. Imparáveis? Torno ao Larousse, onde também registo este conceito de revolução: “movimento circular pelo qual um móvel volta à sua posição de origem”. Que revolução terá sido a nossa – esta ou a anterior?
– Meu amor, os cravos são
gritos de fogo à janela:
nossos, que a revolução
ninguém dá nada por ela.
António Cabral [1931-2007] foi um poeta, ficcionista, cronista, ensaísta, dramaturgo, etnógrafo e divulgador da cultura popular portuguesa.