Quadras e quadros

Diário de Notícias. Foto de Alfredo Cunha.
Diário de Notícias. Foto de Alfredo Cunha.

Gosto de me servir dos dicionários. Quantas ideias me oferecem, sem pedirem em troca mais do que o preço de os comprar e/ou consultar! Abro o Petit Larousse e leio (traduzo): “revolução: mudança brusca e violenta na estrutura económica, social ou política de um Estado”. É evidente que estou a pensar no 25 de Abril e no que ele teve de autenticamente revolucionário. Foi efectivamente uma mudança brusca e violenta em múltiplos sectores da vida portuguesa. Violenta, acentuo, apesar dos cravos e das ovações. A violência não quer dizer apenas guerra e sangue que, de resto, não são a sua melhor e mais bela forma; quer dizer sobretudo (volto ao Larousse): “força intensa, impetuosa”. Ora esta existiu: um querer que estilhaçava as taipas que quase cinquenta anos colocaram entre o eu e o mundo, mergulhava no fundo da nossa personalidade e aí arrancava caudais impetuosos, dir-se-ia imparáveis. Imparáveis? Torno ao Larousse, onde também registo este conceito de revolução: “movimento circular pelo qual um móvel volta à sua posição de origem”. Que revolução terá sido a nossa – esta ou a anterior?

– Meu amor, os cravos são
gritos de fogo à janela:
nossos, que a revolução
ninguém dá nada por ela.

in Correio do Planalto (30-05-1978)

António Cabral para Eito Fora por Pedro Colaço Rosário (2001)

António Cabral [1931-2007] foi um poeta, ficcionista, cronista, ensaísta, dramaturgo, etnógrafo e divulgador da cultura popular portuguesa.

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