Ver os destroços do automóvel,
o teu corpo ainda. E os dias cumprindo
o arco, oh borboletas de fogo!
Quem se atreverá a plantar-te na memória?
«Foi melhor assim» – disseste, dentro já
da inconsútil ideia oferecida.
Era quase manhã: anoitecia
o teu espírito visível nas estrelas.
Digamos que não morreste, a bomba
traiçoeira explodiu, continua a explodir
dentro deles, dos inimigos do povo. Aleluia!
Sepultemos a rosa insuportável.
O que é preciso é recompor o silêncio,
dizer ao vento: sopra, Maximino.
António Cabral [1931-2007] foi um poeta, ficcionista, cronista, ensaísta, dramaturgo, etnógrafo e divulgador da cultura popular portuguesa.