Descrição
Embora directamente – pois nem se quer o conhecemos pessoalmente – o autor nada tivesse feito por nós, indirectamente fez algo de muito importante: ajudou-nos a regressar à criança que fomos, quando jogávamos à Macaca, à Bilharda, ao Berlinde, ao Pião e ao Agarra-Agarra, pela simples leitura do seu interessante livro.
Estou em crer que, conforme Jesus Cristo fez o favor de lembrar, “se não nos tornarmos como as crianças não entraremos no Reino dos Céus”, por isso – pedindo licença e fazendo vénia a alguns esoteristas – teremos que considerar Jogos Populares Infantis como um livro iniciático.
Explicamos:
No Mundo de hoje as crianças de ontem em lugar de jogarem ao Rapa, ao Carolo, ao Assalto ao Castelo e à Estátua entregam-se a jogos muito mais perigosos a que podemos chamar de Senhor Ministro, Economista, Deputado, Administrador de Empresas e outras brincadeiras que levam a sério. Tão a sério ao ponto de, na maior parte das vezes, não olharem a meios para atingir fins, atirando o próximo para a valeta da vida num “arreda! arreda!” implacável, nem sequer sonhando que aquilo que fazem aos outros estão, simplesmente e apenas, fazendo a si próprios.
Isto porque todos somos, enquanto vivos, ondas do mesmo mar.
O António Cabral já pensou como seria interessante e saudável, para eles e para nós, se o senhor Ministro X, depois de ler o seu livro, em lugar de redigir um decreto-lei que nos irá seringar a paciência, resolvesse afastar a secretária e as cadeiras do gabinete para, com os colaboradores mais próximos, jogar às Escondidas?
Parece estarmos a vê-lo, com os olhos tapados pela primeira série do “Diário da República”, enquanto os colaboradores se escondiam, dizendo a inevitável lengalenga: “Serapico, pico, pico / quem te deu tamanho bico / foi a filha do juiz / que está presa pelo nariz / os cavalos a correr / e as meninas a aprender / qual será a mais bonita / que se irá esconder?”.
Se ele conseguisse voltar a brincar a esse jogo, atirando para trás das costas o chavão do “parece mal”, do “um homem não chora”, ou do “mesmo quando faz xi-xi nas calças, quando chega a casa diz à mulher que é suor”, ficaria iluminado de imediato.
O mesmo poderia suceder a um desses Executivos chatos, sempre com a pasta James Bond carregada de estatísticas e de “stress”, dominados pelo primitivo vício de se mostrarem profissionalmente agressivos, julgando só assim conseguirem ganhar a vida quando, afinal, a perdem. Caso um grupo deles se reunisse em pleno Rossio e começassem a jogar ao Jardim Celeste, mesmo sem vestirem bibes, alcançariam, no momento, a paz interior do (sic) sábios.
Como seria interessante uma fila desses alicerces da sociedade de consumo a avançar, aos saltinhos, para o obelisco do D. Pedro, cantando embevecidamente: “Eu fui ao jardim celeste / giroflé, giroflá / Eu fui ao jardim celeste / giroflé, giroflá”.
E a outra fila responderia: “O que foste lá fazer? / giroflé, giroflá / O que foste lá fazer? / giroflé, giroflá?”.
Antes que os primeiros explicassem terem ido lá buscar uma rosa o Mundo estaria transformado para melhor.
Por tudo isto tenho de agradecer ao António Cabral a publicação do seu livro e quanto ao adequado emprego da obra, aí deixe-me ficar com legítimas dúvidas.
Talvez isso venha a acontecer um dia… 1
O autor tem dedicado ao tema obras de importância capital. Ele é o mais importante dos raros estudiosos portugueses neste sector da antropologia social. A esta editorial a importância de ter reunido na colecção “Coisas Nossas” livros tão marcantes como Jogos Populares Portugueses de Jovens e Adultos, Teoria do Jogo e, agora, este terceiro tomo. Para além do inventário dos jogos, há o próprio estudo teórico da actividade lúdica aqui compreendida. Um índice remissivo dos jogos infantis recolhidos por António Cabral, em muitos casos, recupera do esquecimento alguns deles. E vale a pena colhermos algumas designações curiosas: alhas-alhas, apitos e gaitas, arranca-cebola, bacalhau, barra da bandeira, testa quadrada, bom barqueiro, caça às cegonhas, carvalhinha seca, cegos e paralíticos, coelhinha que procura a toca, dona-sancha, eixo do era uma vez um homem, fulaninho que me matam, garrafa de lixívia, joão-grosso, macaquinho do chinês, ordens na tropa, prego no caracol, rabo de burro, rompe o touro, senhor mestre sapaterio (sic), três paulitos, trincopeido, richo, entre outros.
“Até à idade escolar”, escreve António Cabral, “o jogo é, de facto, a mais séria, isto é, a mais exaustiva ocupação da criança, o que não quer dizer, só por si, que o jogo seja entendido a sério, embora, como veremos, ou seja, efectivamente.” E, a propósito de chamar aos jogos infantis jogos populares, Cabral justifica-o “pela simples razão da sua simbologia se liga, na esmagadora maioria dos casos, aos costumes do povo, mormente do povo rural. E ainda porque as crianças, seja qual for a classe social dos seus pais, os jogam indistintamente. Quando o não fazem, temos sempre se suspeitar de uma anormalidade ou de uma intervenção paterna, por vezes subtil”.
Neste seu novo livro, António Cabral estuda o “eu” e o “outro” no jogo infantil, a função dos jogos populares no ensino, os parques infantis e as ludotecas, seguindo-se, então, os jogos populares propriamente ditos, com as suas regras fundamentais.
Este Jogos Populares Infantis constitui um obra importante para professores, pais, educadores, nomeadamente os responsáveis por escolas, jardim-escolas e ludotecas. Trata-se de um instrumento de trabalho de extrema utilidade. Indispensável. 2
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