Podíamos ser como esta árvore
que dá flores,
sem pensar em mais nada.
O sol pousa-lhe nos ramos
e todas as pétalas o saúdam
muito simplesmente,
porque é essa a sua maneira de ser.
Uma ave descreveu um círculo e passou,
um rumor de asas desce pelas folhas,
uma canção fere docemente o espaço.
Tudo está certo.
A noite virá,
virá o Outono
e a árvore continuará,
simplesmente,
sem pensar em mais nada.
Podíamos ser assim:
entrar neste momento,
floridos. Harmoniosos.
Simplesmente. Muito simplesmente.
António Cabral [1931-2007] foi um poeta, ficcionista, cronista, ensaísta, dramaturgo, etnógrafo e divulgador da cultura popular portuguesa.